Conhecendo o meu tio, sabia que quando essa hora chegasse ele faria alguma coisa especial. Só não imaginava que eu teria algo com isso. Alguns dias atrás, um Pidove me trouxe uma carta dos meus pais. Uma carta que Nicola me deixou, me informando de uma herança dele que agora passará para mim, pois era jovem e tinha meus "pés no chão". Estou seguindo as informações que ele deixou, mesmo com minha insegurança e péssima autoestima, estou fazendo isso por ele, o que me trouxe até o a zona desértica de Unova, uma aventura para os exploradores mais experientes.
— Zac, use Rock Smash — pedi, e logo meu parceiro, o Boldore Zac, deixou sua Pokeball e quebrou uma rocha que bloqueava uma passagem — Heh, acho que encontramos, companheiro.
O que meus olhos observavam com um pouco de dificuldade devido às tempestades de areia era o enorme Castelo da Relíquia, o enorme lugar que acredita-se ter sido o coração de uma sociedade que vivia em harmonia com os Pokemon. Mesmo coberto por toneladas de areia eu conseguia ver vestígios de sua pintura esverdeada, assim como partes do castelo que já não existiam mais e agora tornavam-se entradas.
Desci com Zac até o castelo e consegui espantar um bando de Sandile que dormiam por ali. Posso não parecer, mais já saí em jornada por Unova, não consegui oito insígnias por ter desistido após múltiplas derrotas, mas eu sei como comandar um Pokemon.
~Boldor — murmurou Zac, que caminhava ao meu lado para dentro da entrada do castelo.
— Está tudo bem, não se preocupe — eu disse, forçando um sorriso. É tudo que eu consigo fazer nos dias de hoje. Forçar um sorriso, dizer que vai ficar tudo bem, mostrar que eu estou bem. Eu sei que meus Pokemon não podem me dizer, mas todos continuam abalados pela minha desistência dos ginásios. Eu falhei com eles, os desapontei, dei esperanças falsas de um sonho meu que talvez fosse possível, mas não é. Então me dou conta de que estou caminhando em direção a sabe-se sei lá onde, não havia iluminação alguma — Vamos precisar da Katy.
Katy é minha Zebstrika, a primeira Pokemon que capturei vencendo numa batalha. Ela tem a tipagem de Pokemon elétrico, então a trouxe comigo para usar como uma lanterna viva.
— Agora está muito melhor, garota! — exclamei, elogiando Katy, que sorri como agradecimento.
Definitivamente o Castelo da Relíquia é um lugar misterioso. Pesquisei antes de vir para cá e só achei depoimentos de pessoas que vieram explorar por aqui, mas nenhum de pessoas que voltaram da exploração. Agora que parei para pensar, estou ficando com medo... As paredes estão cobertas de areia, só vejo pilares e vasos de barro. Alguns Sandile aqui e ali, Woobat e Swoobat descansando pelo teto. Algo estala abaixo de meu sapato, mas não tenho coragem para olhar.
~Boldor!
~Blitz!
— U-um osso? — me pergunto, então olhando e descobrindo que pisei na ossada de algum explorador que passou por aqui. Mas os ossos não estavam normais, não pareciam quebrados, mas... tinham manchas. Queimaduras, alguns tinham partes comidas, talvez por insetos.
~Blitz! Blitz! — relinchou Katy, batendo as patas e criando um eco pelo local.
— O que foi, garota? Está sentindo algo?
~Boldor!
— Heh? Não estou entendendo!
Minhas Pokeballs se abrem sem que eu comande, e logo o resto da minha equipe estava ao lado de fora. Senti Tony, o Tranquill, pousar em meu ombro. Ludo, o Tirtouga, saltou sobre minha cabeça e se posicionou entre Diego, o Stoutland, e Zac. Katy batia as patas no chão cada vez mais forte, algo estava se aproximando e tudo que eu sentia era medo. Zac, Katy, Tony, Ludo e Diego deixaram suas esferas e estão em posição de luta, devem estar sentindo alguma presença no ar. É então que minhas costas começam a coçar, como se várias formigas caminhassem por elas e dançassem alguma música da Ariados Grande.
~Pruu! — gritou Tony. Não consegui enxergar o que ele fez, mas senti seu Air Slash nas minhas costas, e logo a coceira parou.
— Tony, que diabos... Woah!
Ao momento que me virei, um Pokemon fascinante estava diante de mim. Uma espécie de inseto gigante, com suas asas abertas lembrando pétalas de flores flamejantes. Os olhos azuis brilhavam e eu sentia que diziam "Ei, você vai morrer hoje!". Se me pedissem para ser irônico, com certeza eu diria que o que eu via era muito amigável.
~Cacum! — gemeu o Pokemon, incendiando as asas e disparando labaredas na minha direção. Cruzei meus braços na frente de meu rosto, mas Ludo usou Hydro Pump para apagar o fogo com muitas dificuldades.
— Mas que monstro é esse?! Não é alguma espécie que eu conheça!
~Carooommm! — gritou a criatura, se remexendo e liberando uma onda de minúsculos insetos que nasceram em suas asas para atacarem os meus Pokemon. Se tratava de Struggle Bug.
— Diego, use Fire Fang! Katy, dispare o Thunder Shock!
Incendiando suas presas, Diego move seu corpo de cachorro pesado e morde o Pokemon, que como eu pensei era um tipo inseto, já que sofreu muitos danos. Assim que ia revidar, Katy energiza sua crina e descarrega vários choques ao seu redor, formando uma prisão elétrica.
~Cacum!
Mais uma vez usando as chamas, o Pokemon incendeia o campo elétrico, causando danos em todos os meus Pokemon. Eu costumo conhecer os Pokemon que enfrento, mas aquela espécie eu nunca tinha lido sobre. Um inseto gigante com asas de fogo que habita castelos num deserto? Como isso pode existir?
~Boldor! — gritou Zac, me despertando novamente dos pensamentos. Eu sentia que ele podia me compreender, e sabia que ele tinha certeza de que eu estava me cagando de medo.
Na minha frente eu via Tony tentar bicar o Pokemon, um fracasso, acabando por sair com o corpo queimado, me fazendo deduzir que sua habilidade seja Flame Body. Ludo disparava rochas numa tentativa de esmagar o inseto, Katy se aproveitava de sua velocidade para atingi-lo nas costas, Diego recuperava suas energias gastas de um Retaliate e Zac ficava ao meu lado como um guarda costas.
~Boldor!
— Está tudo bem! Deixe que os outros derrotam ele!
~Boldor!
Eu não estava entendendo o que Zac queria me dizer. Queria saber falar Boldorenês, mas infelizmente não nasci como um Boldore. Ele parecia irritado, mas não percebo o motivo. Minha insegurança, talvez. Ou será que estou sendo inseguro pensando que Boldore se irritaria com algo que eu convivo faz tempo, mesmo sendo meu parceiro há tanto tempo?
~Boldor!!! — agora gritou, saltando para cima de mim e me derrubando no chão coberto de areia. Por cima de minha cabeça, Ludo e Diego eram arremessados, batendo com tudo numa pilastra e provocando a quebra dos vasos de barro que pareciam estar faz tanto tempo neste cômodo ~Boldor!!
— O que você quer me dizer? Eu não consigo entender... Mas eu quero!
~Boldor.
"Você pode fazer qualquer coisa, desde que realmente a deseje." Lembrei das palavras de Nicola, o meu tio. Encarei Zac por alguns segundos, me sentia esquisito olhando para os olhos do pedregulho ambulante que me acompanhava e agora reparava que haviam migalhas em sua boca, dos doces que o dei antes de vir para cá. Mesmo viajando nas ideias, por um segundo senti ouvir a voz dele. Não estava irritado, muito menos frustrado ou incomodado. Zac estava decepcionado. Meus Pokemon enfrentavam uma criatura mortal que quase os queimava vivos em minha frente, e eu não fazia nada, apenas esperava.
— Zac, Katy, Tony, Ludo, Diego... — murmurei, cerrando os punhos. Repetindo as palavras do meu tio na minha mente, pegando coragem de não sei onde e usando uma força que nem sabia que eu tinha, avancei contra o Pokemon e me arremessei nele, salvando Tony de ser engolido por chamas enquanto Katy se esforçava para manter a eletricidade que iluminava o local. Nem deve ser possível enxergar meus cabelos castanhos agora, já que o meu movimentou fez areia voar para cima de mim.
~Cacum!!
— Você não vai nos impedir! Estou fazendo isso pelo meu tio! Não é nenhum inseto gigante e feio que vai me impedir de fazer a última coisa que uma das únicas pessoas que acreditam em mim me pediu! — gritei, e por um instante sorri. Senti como se eu fosse um Pokemon e tivesse acertado um golpe crítico, meus pulmões se enchiam com coragem. Mas a realidade bateu na porta da minha casa e eu a recebi literalmente com um murro, porque eu não sei o que o bicho fez comigo, mas eu sei que estava com ódio, me arremessou para outra pilastra do cômodo. Senti minhas pernas falharem e não conseguia levantar, parecia que a minha coluna saiu do lugar, já que sentia uma forte dor. Estava com as pernas cobertas de areia, e quando me dei conta, estava sem calças.
~Cacacacum! — riu o Pokemon, queimando minhas calças com o fogo que suas asas liberavam. Agora eu estava de cuecas com estampa do rosto de um Ducklett, preso num monte de areia e vendo meus Pokemon correrem de um inseto pegando fogo. Que belo dia, não?
— Zac, preciso que os ajude! Vou improvisar um plano que acabei de inventar — falei, e não menti para meu amigo Boldore. Minha criatividade para inventar coisas era algo que meu tio adorava em mim, dizia que puxei esse lado dele.
~Boldor!
Conseguindo catar pedaços dos quebrados vasos de barro que estavam ao meu alcance, criei uma fonte de munição. Me imaginei num cenário onde ao invés de mãos eu tivesse metralhadoras, e ao invés de pedaços de barro eu tivesse munições. As vezes eu me impressiono com minha capacidade de sair da realidade.
~Touga! — bravou Ludo, como um soldado. Se sentava nas costas de Diego, os dois já reerguidos e prontos para voltar ao combate. O inseto no momento estava mais preocupado em parar os movimentos de Tony, que usava sua velocidade para o cansar e desperdiçar seus golpes, enquanto Katy aumentava seu poder com Charge.
— Escutem, vou precisar que façam esse bicho virar na minha direção! — gritei, e todos parecem entender.
~Boldor!
Zac sempre foi um Pokemon esperto, mas o modo que ele arrumou um jeito para o que eu pedi se tornasse possível nessa situação me deixou boquiaberto. Criando uma avalanche de rochas, Zac dificultou o caminho de Diego e Tirtouga, que sentiam dificuldades em se movimentar sob elas. Distraídos com a situação, Tony e Katy são empurrados para trás, batendo de costas numa parede. O inseto gigante avançava na direção dos novos alvos mais fracos, para tirar vantagem da situação deles. Como previ, a avalanche trouxe os dois para a minha frente, e quanto o Pokemon iria disparar suas chamas, disparei minhas metralhadoras e acertei todas as munições em sua cabeça, arrancando gritos da criatura. A partir de hoje respeitarei sempre os vasos de barro.
~Cacum!! — apenas com seu grito, o Pokemon liberou uma onda de energia que fez todo o castelo balançar. Suas asas se carregam com fogo e ele o dispara para todos os lados, destruindo a avalanche de Zac e derrubando Diego e Ludo.
— Não! Não! Não era para isso acontecer... Não adianta, por mais que eu deseje vencer, eu não consigo. Não consigo parar de errar em algo. Eu errei em deixar as insígnias por perdemos tanto, retirei confiança de vocês com isso e não retorno para esse caminho por medo de como vão me julgar. Eu não consigo compreender vocês, já que eu também não consigo fazer isso nem comigo mesmo... Eu gostaria de ser um bom treinador para vocês — concluí, enquanto o Pokemon me fuzilava com o olhar. Então percebi o que eu havia dito. Coloquei tudo que sentia para fora e os meus Pokemon pareciam chocados com meu momento.
~Pru!! Pruu!
~Boldor!
~Blitz!
~Touga!
~Couf couf!
Ainda não falo Boldorenês, Zebstrikano, Tranquilinês, Tirtouguês e Stoutlandico, mas eu juro que entendi tudo que eles gritaram para mim. Tudo que eu já deveria ter entendido, mas demorei tanto por ser como eu sou. Eles não me julgavam por ter abandonado os ginásios, se importavam comigo, estavam ali lutando por mim por esse exato motivo. Poderiam fugir e se salvarem, mas não, estão aqui, diante dos meus olhos, se esforçando para vencer o nosso oponente esquentadinho asqueroso, como o apelidei. Zac, Katy, Tony, Ludo e Diego estavam tentando me dizer isso o tempo inteiro.
— Vocês... Ahh!, eu amo tanto vocês! Por favor, vamos nos unir agora! Combinem todos os seus golpes, vamos acabar com esse desgraçado! — gritei, sem deixar de olhar nos olhos do Pokemon em minha frente.
Os momentos seguintes eu não sei como descrever. O Pokemon que poderia ter me matado se moveu muito rápido, tão rápido que me deixou tonto. Ouvi barulhos de trocas de golpes, o que significava que todos os meus Pokemon atacaram e conseguiram nocautear o oponente. Acordei minutos depois, deitando nas costas de Diego, enquanto Tony estava de pé sob minha blusa queimada.
— Nós... vencemos? — perguntei, novamente percebendo que estou de cueca e vestindo trapos como blusa.
~Boldor! — exclamou Zac, saltando para os meus braços e me derrubando na areia. Olhei para o outro canto do cômodo e vi o Pokemon sem mais forças, com feridas espalhadas pelo corpo.
~Couf! — latiu Diego, e então vi Katy e Ludo empurrando um baú dourado em minha direção.
— A herança do tio Nicola... — murmurei, abrindo o baú e encontrando a maravilhosa, grandiosa e exuberante herança! Era o que eu queria ter dito. Havia apenas outra carta, colada numa Pokeball grande, velha e roxa — "Querido Mike, essa é a Masterball, a Pokeball suprema que pode capturar qualquer Pokemon sem precisar antes de uma luta. Eu a ganhei quando fundei Nimbasa, como um presente. A verdade é que ninguém sabe o real valor dela, então a confio com você, creio que com o seu jeito de ser você vá conseguir usá-la bem. Está sendo protegida pela minha Volcarona, um dos meus Pokemon mais fortes que confiei ao castelo da relíquia. Sei que saberá quando for a hora certa de usar a Masterball. Além de tudo, se conseguiu vencer a Volcarona, o que eu te disse era verdade. Você pode fazer qualquer coisa, garoto. Não importa como você seja. Se um sonhador como eu fundou uma cidade, quem te impede de virar o Campeão de Unova? Haha!"
~Boldor!
Assim que terminei de ler, senti o braço de pedra de Boldore enxugar uma lágrima minha. A herança não foi só a Masterball. Nicola me passou sua determinação e fez reacender algo que eu pensava estar morto.
— Zac, Katy, Tony, Ludo, Diego... O que vocês acham de tentar mais uma vez no ginásio de Nacrene? — perguntei, abrindo um sorriso. Meus Pokemon não tiveram a reação que eu esperava, mas acho que ficaram felizes. Todos começaram a chorar, com exceção de Zac, que improvisava um sorriso — N-não era para chorarem!
~Boldor!
— É, você está certo, são lágrimas de alegria! — falei, mas logo arregalei os olhos. Eu entendi de novo o que Zac disse. Acho que de fato eu falo Boldorenês.
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